Toda vez que um animê ganha adaptações no cinema (tanto americano, quando japonês), os fãs ficam de orelhas em pé, e com Ghost in The Shell não é diferente. Um dos animês mais cultuados da cultura pop, reconhecidamente a grande inspiração de Matrix, ganha sua chance de ter uma versão Hollywoodiano com tudo a que tinha direito, bom orçamento, super estrela como protagonista, marketing forte. O resultado é um filme incrivelmente fiel… visualmente, apenas.
A produção se passa em um futuro próximo e gira em torno de Major. Ela é a primeira de sua espécie: uma humana que foi ciberneticamente melhorada, com a função de deter os avanços de crimes tecnológicos e cibernéticos. Na medida em que se prepara para enfrentar um novo inimigo, ela passa a se questionar cada vez mais sobre a sua verdadeira origem.
Assistindo ao animê recentemente, uma coisa ficou muito clara em relação a essa adaptação, mudanças eram necessárias. Não se pode esperar que o grande público abrace aquela história exatamente da forma como ela é. No entanto, A Vigilante do Amanhã: Ghost in The Shell levou isso bastante a sério, fora algumas cenas mais pontuais, parte visual e fã services, o filme é muito diferente do animê, então se você está interessado, não se apegue muito a isso (fidelidade a história original).
O longa começa mostrando a linda cena de construção da Major, com belos efeitos visuais e um 3D bem pensado, para logo em seguida partir para um lado mais dramático sobre a aceitação da personagem quanto a sua nova condição. Uma plot bastante carregada, que já nos deixa enxergar uma grande diferença da história original e ainda bebe muito da fonte de Robocop. Essa mudança de direção vai ficando mais evidente nos primeiros minutos, quando percebemos que o “artigo” colocado no título (A Vigilante) faz jus ao que ele propõe, pois é uma história puramente de personagem. Desde o drama clássico da auto descoberta, a relação materna com sua “criadora”, não há nada que fuja do olhar daquela mundo através da Major.
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Toda a parte filosófica é achatada e mastigada para o grande público, nenhum passo é dado no filme sem que tenha sido explicado antes, até mesmo cenas de homenagem ao animê são pré-anunciadas a exaustão. Talvez funcione para o público pré adolescente, mas os mais adultos podem ficar entediados com a ausência de surpresas, de interpretações e outros artifícios bem utilizados no original. Se por um lado se fecha um arco sobre as origens da Major, que poderia ser melhor explorado em outros episódios, por outro lado, há uma preocupação muito clara em deixar assuntos para resolver nos próximos filmes (aquela fome de franquia), tal como colocar enxertos desnecessários para ganhar tempo, como origens de partes do corpo e até um “quase” interesse amoroso da Major.
A construção dos personagens oscila muito, apesar dos trejeitos robóticos exagerados de Scarlett Johansson, faz falta uma certa ingenuidade na personagem. Enquanto o vilão principal, vivido por Michael Pitt (Os Sonhadores) é genérico e com atitudes extremamente previsíveis.
Rupert Sanders (Branca de Neve o Caçador) comanda uma parte técnica bem executada. Como os trailers já vendiam, a direção de arte (parte visual) é incrível, os cenários futuristas lembram Blade Runner , Eu Robô e o próprio Ghost in the Shell (animê), que também é reverenciado em frames idênticos, que parecem uma conversão literal da animação para o real, sempre com uma grande variedade de cores que dão um contraste com a frieza dos personagens, deixando uma inteligente sensação de desolamento. O longa também é bem fotografado, sem grandes novidades, mas consegue mostrar de forma competente a ação, cenas que de forma geral, são divertidas. Fora a ótima execução dos efeitos visuais, elas ainda contam com as possibilidades lúdicas oferecidas pelo futuro. É bem verdade, que falta muitas vezes uma construção de “climax” para as sequências mais aguardadas, porém, elas sempre são um vislumbre visual. Destaque para a excelente primeira cena de ação num prédio (já vista nos trailers), que tem um 3D impressionante e lembra Matrix, por coincidência a única vez no filme em que podemos identificar essa inspiração.
Enfim, A Vigilante do Amanhã: Ghost in The Shell é um filme que tenta estabelecer uma marca conhecida no meio “nerd” como franquia de massa, e para isso, esquecendo alguns sucessos do cinema, adota uma postura pessimista quanto a capacidade do público absorver conceitos um pouco mais complexos. O medo de mergulhar em sua própria essência mais filosófica, que é o grande diferencial da história, faz da versão americana de Ghost In The Shell mais um filme de cyborgues do futuro, com uma contestação simples de ética robótica e um desenrolar pouco ousado, bem abaixo da capacidade da adaptação e da expectativa criada em torno dela. Confira o trailer e nossa “Chuck Nota” logo abaixo.