O Escândalo (Bombshell)
O Escândalo (Bombshell)

Os bastidores da “normalização” dos assédios na TV

Um gigante do telejornalismo e antigo CEO da Fox News, Roger Ailes (John Lithgow) tem seu poder questionado e sua carreira derrubada quando um grupo de mulheres o acusam de assédio sexual no ambiente de trabalho.

Para quem não conhece o caso, uma rápida pesquisa pode dar a amplitude da situação. Trazendo para o nosso contexto, imagine se a Fátima Bernardes e outros jornalistas da Globo viessem a público denunciar um dos grandes diretores de emissora. Foi basicamente o que acontece na Fox, o maior canal por assinatura nos Estados Unidos, até então.

O filme de Jay Roach (“Trumbo – A Lista Negra”), faz uma escolha por adotar um tom mais jornalistico ao longo da narrativa. O estilo de montagem lembra bastante quadros de telejornal, além dos famosos bastidores da notícia que as emissoras costumam vender para endossar a credibilidade.

Da quebra da quarta parede até os gráficos, no início, o filme emula o excelente “A Grande Aposta”, com uma breve explicação sobre como funcionava a Fox e o império da Tv norte – americana.

Porém, quando esse tom mais jornalístico se prolonga, começam os problemas do longa. Em “O Escândalo”, não há espaço para respirar e assimilar a seriedade do assunto. Sentir a verdadeira dor das personagens e criar empatia na dose correta.

O roteiro de “O Escândalo”, não se decide sobre contar a história ou construir uma imagem intacta de Megyn Kelly (Charlize Theron) e Gretchen Carlson (Nicole Kidman). Nunca fica muito clara a relação dos assédios com a posição delas na emissora, ou mesmo, até que ponto elas foram coniventes com assédios a profissionais “menores”, enquanto isso lhes era conveniente.

Mesmo com um prólogo sobre um enfrentamento de Megyn com Donald Trump, que pode agradar boa parte do público (e desagradar outros tantos), é muito difícil criar ligação com essas duas personagens em especial. O desenvolvimentos das personagens e a própria atuação de Charlize Theron (indicada ao Oscar pelo filme), e Nicole Kidman não entregam o incômodo necessário da situação.

Mas, é irônico que a única forma de realmente sentirmos o peso do ambiente tóxico retratado, seja através de uma personagem fictícia. Cabe a Margot Robbie, o papel de Kayla, uma mistura de vários depoimentos de mulheres que acabaram culminando na personagem. A excelente atuação de Margot Robbie (também indicada ao Oscar pelo longa), nos entrega as cena mais marcantes de “O Escândalo”. Kayla é a única que realmente dá a dimensão dos acontecimentos.

O Escândalo (Bombshell) Charlize Theron (Megyn Kelly) e John Lithgton (Roger Ailes))
Charlize Theron (Megyn Kelly) e John Lithgton (Roger Ailes))

Duas cenas em especial são extremamente duras. A primeira vez que Kayla tem contato com o estilo de Roger Ailes “analisar” suas futuras repórteres, onde Margot tem uma transição incrível da felicidade ao desconforto. E um segundo momento, onde aparentemente a personagem sabe que irá acontecer o abuso de fato, e Margot age como uma presa amedrontada indo para o abate, na já conhecida cena do elevador.

Quem também contribui para que essas cenas funcionem é o veterano John Lithgow (“Planeta dos Macacos: A Origem”), que interpreta Roger Ailes como o típico manda chuva da indústria, que não vê problemas em seus métodos.

Enfim, “O Escândalo”, aborda acontecimentos recentes (o caso estourou em 2016), talvez fosse necessário mais tempo para a primeira adaptação desse caso. Faz falta um panorama mais amplo, o que explica a dificuldade do roteiro em humanizar mais a história. Vale e se faz necessário como “documento” da história, mas como produto de cinema é menos interessante do que parecia ser… Confira nossa “Chuck Nota”, logo abaixo.