Ainda que vindo de bons trailers e uma premissa interessante, O Contador chega como uma grata surpresa, um filme de ação forte e bem amarrado que mostra uma escola de cinema moderna, muito bem – vinda nesse cenário atual de Hollywood.
No filme Ben Affleck vive o contador Christian, homem que tem mais afinidade com números do que pessoas. Usando um pequeno escritório como fachada, o educado Christian presta serviços de contabilidade para algumas das organizações criminosas mais perigosas do mundo. Quando a polícia está perto de descobrir suas atividades Christian assume um cliente “real” onde uma assistente descobriu um desvio de milhões, mas quanto mais Christian chega perto da verdade, maior é a “conta” de corpos que ele tem que deixar no caminho.
Em seis anos de Has Tela Vista, essa é primeira vez que eu escrevo isso… Ben Affleck está muito bem no filme. Leia que esse “muito bem”, não é como um Al Pacino, calma lá. Em verdade, ocorreu um casamento perfeito do estilo pouco expressivo de Ben Affleck, com o “jeitão” que o personagem precisava.
O Christian de Ben Affleck é bem construído, engraçado mesmo sem tentar ser, tem uma postura naturalmente cética, metódica e extremamente (digo extremamente), direta. Sua naturalidade para lidar com situações pesadas do filme, beiram a ironia e inevitavelmente arrancarão risos de espanto do público. Apesar de ser quase um “Batman”, Affleck consegue se distanciar de seu (agora) personagem mais famoso, através do desenvolvimento da personalidade cheia de tiques do “contador”.
Além de Ben Affleck, o elenco ainda conta com um time de coadjuvantes de muita qualidade. O fantástico J.K Simmons (Whiplash), a inexplicavelmente carismática Anna Kendrick (A Escolha Perfeita), e o competente John Bernthal (O Justiceiro da série O Demolidor). Todos eles se entrelaçados na trama de forma totalmente orgânica.
Poucas pessoas sabem, mas o filme é inspirado numa história em quadrinhos da Vertigo, um ótimo selo adulto lançado pela DC Comics. E o longa respeita esse estilo, cheio de toques refinados e detalhes que o grande público pode não entender com facilidade, como os gostos culturais peculiares do personagem título.
O roteiro se equilibra entre reviravoltas surpreendentes e alguns caminhos previsíveis, mas bastante coerentes com a proposta de O Contador. Tudo bem amarrado através de flashbacks, aqui utilizados de forma inteligente, sem exageros. Nessas boas viradas, temos algumas subplots com um grau de sensibilidade intrigante, como a inesperada motivação para o policial de J.K Simmons querer descobrir quem é O Contador, ou os desfechos de cenas de ação com altos níveis de criatividade. Como se não bastasse, a produção ainda introduz uma honesta e arrebatadora mensagem sobre crianças autistas e suas dificuldades de se desenvolverem numa sociedade que não as compreende.
Gavin O’Connor que não apresentava um currículo impressionante até então, entrega um trabalho de direção redondo, administra com sobras os diversos aspectos cobrados para um filme assim.
As ótimas coreografias de ação, são baseadas em movimentos mais realistas e menos plásticos. O que se vê, é muito Jiu Jitsu e Boxe, métodos de defesa mais práticos, abraçados por Ben Affleck, que efetivamente assume o “exército de um homem só” em ótima forma (pelo menos ao que parece, não tem muitas cenas com dublês). O trabalho de fotografia também brinca com a paleta de cores e iluminação para colocar o personagem de Affleck em mundos e climas diferentes durante as diversas passagens da trama. Em alguns momentos o longa chega até a lembrar John Wick (De Volta ao Jogo), o recente sucesso de Keanu Reeves, que além de apostar no realismo, brincava com a mistura de armas de fogo e lutas corpo a corpo em suas coreografias. algo muito presente aqui também.
Enfim, O Contador é um filme de ação de primeira linha, com um roteiro bem acima da média do gênero e, para desespero dos mais chatos, dá um banho de cinema em alguns soníferos concorrentes ou vencedores do Oscar nos últimos anos… Confira nossa Chuck Nota logo abaixo…