Quase 10 anos depois de ter encerrado muito bem a franquia com Rocky Balboa, Sylvester Stallone aceitou o desafio do jovem diretor e roteirista Ryan Coogler de voltar ao personagem, numa história ousada (e arriscada), e ambos mostraram que valeu a pena. Eu assisti o filme em dezembro e segurei esse texto, por coincidência, esse domingo, Sylvester Stallone ganhou o inédito Globo de Ouro de melhor ator coadjuvante por sua atuação em Creed: Nascido Para Lutar, abrindo caminho para um também inédito Oscar, que seria uma ótima coroação para esse trabalho de uma equipe extremamente talentosa e apaixonada pela saga Rocky.
Em Creed: Nascido Para Lutar, Adonis Johnson (Michael B. Jordan) nunca conheceu seu pai famoso, o campeão mundial dos pesos pesados Apollo Creed, que morreu antes de ele nascer. Ainda assim, não há como negar que o boxe está em seu sangue, então Adonis parte para a Filadélfia, local da lendária luta de Apollo Creed com um adversário durão chamado Rocky Balboa.
Uma vez na Cidade do Amor Fraternal, Adonis localiza Rocky e pede para ele ser seu treinador. Apesar de insistir que está fora do universo da luta para sempre, Rocky reconhece em Adonis a força e determinação que viu em Apollo – seu rival feroz que se tornou seu amigo mais próximo. Rocky então concorda em treinar o jovem lutador.
Creed: Nascido Para Lutar é tudo que Rocky 5 deveria ter sido mas não foi. Ryan Coogler pega novamente a ideia de um Rocky mestre, mas acrescenta várias pitadas de bom gosto que faltaram ao filme de 1990. A figura de um Rocky mais experiente e definitivamente fora do ringue contribui para tornar o “Rocky treinador” algo mais palpável, um personagem mais próximo do Mickey que ele tanto citava em Rocky 5, a construção de aluno problemático também se repete, com a diferença de que Michael B Jordan atua muito melhor que Tommy Morrison e o personagem é muito melhor desenvolvido pelo roteiro.
A abertura do filme já impressiona, com uma apresentação crua e direta de Adonis Creed, e uma resposta perfeita para uma das perguntas principais do filme “O que motivaria o filho rico de Apollo dentro dos ringues?”.
O longa apresenta um clima e visual totalmente urbano, com temáticas atuais que conversam facilmente com uma geração que só conhece Rocky Balboa pelo nome. Um dos pontos mais interessantes dessa “atualização” é a trilha sonora, milimetricamente repaginada (não, você não vai ouvir a clássica Gonna Fly durante os treinamentos). Com uma mistura de trilha clássica e hip hop encorpado, cada melodia arrepia nos momentos certos e ainda conta com alguns sons muito familiares, com destaque para a “corrida de Adonis” e a motivação na luta final.
Por falar em lutas, elas são uma grata surpresa, muito bem filmadas, chamam para a franquia Rocky novamente a responsabilidade de mostrar aos filmes modernos como se grava dois lutadores num ringue, coisa que nem mesmo Rocky 6 conseguiu trazer tão bem. Ryan Coogler é sem dúvida um dos cineastas mais talentosos da nova geração tem estilo para filmar, faz uso de uma paleta cores muito própria que já podia ser vista no ótimo Fruitvalle Station: A Última Parada e não atoa vai dirigir o Pantera Negra da Marvel.
O trabalho de Coogler como roteirista aparece muito na forma respeitosa como ele homenageia a franquia sem perder sua personalidade. O filme não é mesmo um Rocky 7, o personagem clássico está lá, faz toda a ponte com o universo Balboa e nos lembra porque gostamos tanto dessa franquia, mas é com certeza um outro filme, uma mistura de remake com reboot. Adonis Creed é definitivamente a figura central desse longa. As boas e velhas lições de Balboa estão presentes como sempre, dessa vez Rocky vive e nos ensina a viver o drama da idade, da despedida das pessoas que amamos e da vida com a qual nos acostumamos. Enquanto por outro lado, lida com a personalidade explosiva de um Adonis que não conheceu o pai e parece sufocado por experiências que gostaria de ter tido. Isso só é possível graças ao trabalho incrível do elenco. Michael B. Jordan sempre tão elogiado, amargou recentemente o fracasso (esperado) de Quarteto Fantástico e parecia fadado a segurar essa bronca, mas em Creed: Nascido Para Lutar o ator mostra novamente porque tem conquistado espaço e arrancado elogios desde sua estréia. Jordan constrói um personagem real, com conflitos reais, com uma raiva e gana por vitória muito crível e dá conta de difícil missão de protagonizar um filme da franquia Rocky, com o próprio Rocky por perto. É um ano de concorrência puxada, mas uma indicação ao Oscar para Michael B Jordan, não seria nenhum absurdo (assim como para o filme). Tessa Thompson que faz Bianca, interesse amoroso de Adonis está longe da ingenuidade de uma Adrian, e encarna com competência uma mulher mais moderna e desapegada, com sua formas mais sutis de demonstrar carinho. Porém, claro, que a atuação mais comentada e talvez surpreendente do filme vem de Sylvester Stallone no personagem que mudou sua vida, parece que ser o coadjuvante lhe fez bem, libertou sua atuação, Sly está muito a vontade e assume com tranquilidade o posto de ser uma homenagem a sim mesmo, um alívio cômico necessário ao denso clima de vida de Adonis Creed. Além das cenas hilárias, Stallone também continua sabendo os comandos certos para emocionar na hora do drama com seu Rocky Balboa. Um fortíssimo candidato ao Oscar.
O que falta a Creed: Nascido Para Lutar é um antagonista “carismático”, alguém pelo qual se faria uma continuação, por incrível que pareça o único problema de Creed é a falta de um Apollo Creed, falta de um adversário que se queira ver lutando com Adonis novamente. Não que tenha problema do filme ser pensado como uma história fechada, o problema é que justamente nessa história fechada, os “vilões” (se é que se pode chamar o lutador adversário assim), não funcionam tão bem como nos momentos mais clássicos da franquia, lá nos anos 80, com Apollo, Clubber e até mesmo Ivan Drago.
Enfim, Creed: Nascido Para Lutar resgata o que há de melhor da franquia Rocky, iniciando algo relevante para a nova geração, uma ideia inteligente e muito bem executada que venceu a desconfiança, trouxe o charme do boxe de volta as telonas (desculpem-me, mas não existe um filme de M.M.A com esse poder), e apresenta um “novo velho” tipo de história para as pessoas curtirem como franquia, sem fantasias, sem efeitos especiais, sem livros como base… apenas boas histórias, com problemas de verdade e coração de verdade… O filme estréia essa quinta-feira dia 14… Confira a Chuck Nota logo abaixo …